sábado, 23 de outubro de 2010

Uma OCA para a UFRGS e um Centro de Vivências para o Campus Saúde


* Texto originalmente publicado no jornal "O Ilegítimo", aperiódico do Coletivo de Estudantes Autônomos, edição de outubro de 2010.

Há uma expectativa muito difundida de que os índios, para serem verdadeiros índios, devem ser fiéis a práticas como o coletivismo, a nudez, a agricultura... Tudo como nos tempos da colonização. O estereótipo molda o imaginário nacional e reflete nas políticas adotadas para os povos indígenas. Serve de desculpa para a invasão de suas terras, para o extermínio de suas populações, para o desmonte de suas organizações e a desvalorização de seus rituais. Mas, os índios são sujeitos tão mutáveis quanto os não-índios. Estão nas cidades, nas universidades. O que está por trás dessa exigência de autenticidade?

Na UFRGS, o convívio entre índios e não-índios traz à tona preconceitos e confusões sobre a identidade indígena. Muitos estudantes condenam o ingresso através de medidas afirmativas de cotas. Algumas opiniões aparecem na forma de abordagens pouco gentis pelos corredores, bibliotecas, moradias estudantis... Há também estudantes que preferem ser contrários em silêncio e guardam o preconceito para si, negando-o e menosprezando a história do país. No discurso, a universidade vangloria a diversidade. Na prática, ainda lida com ela por meio da exceção.

No entanto, existe dentro da universidade mais vida e movimento do que as paredes institucionais conseguem sufocar. O movimento estudantil passa por uma necessária transformação em suas formas de atuação, na tentativa de modificar a realidade descrita. É por isso que, pela primeira vez na UFRGS, índios e não-índios estiveram lado a lado, agindo por causas comuns. Juntos, ergueram uma OCA. As práticas e os saberes indígenas e a histórica inquietude estudantil se complementaram através da ação direta, superando os impasses do mero erguer bandeiras e gritar palavras de ordem. O Campus Saúde, agora, tem um Centro de Vivências e um espaço de referência para o debate sobre as culturas indígenas - cada vez mais presentes na universidade.

Desde o dia 22 de outubro, uma OCA pesa sobre a fronteira que separa índios e não-índios na UFRGS. Uma OCA construída pelas mãos dos próprios estudantes, que apropriaram-se do espaço que é deles, marcando o cenário da universidade e da própria cidade. Em tempos de alienação, as pessoas só enxergam o que está nas suas caras, se interpondo em suas vidas. Logo, se poderá ver em Porto Alegre que nem tudo o que é indígena foi exterminado ou ostracizado. Inclusão não só se discute, mas se constrói.

Nenhum comentário:

Postar um comentário